Werinton Kermes, que dirige documentário sobre Clementina de Jesus, procura material referente à cantora
Era final dos anos 70 quando o jornalista e documentarista Werinton Kermes, acompanhado de um amigo, enfrentou uma sexta-feira chuvosa em Sorocaba, e foi até o Clube União Recreativo para assistir a um show que acabou não acontecendo. No Palco, a negra que arrebatou grandes nomes da então moderna música brasileira, como João Bosco, Milton Nascimento e Caetano Veloso, dividia o palco com alguns músicos, mas a platéia não existia. Clementina de Jesus, ou Quelé, descoberta pelo compositor Hermínio Bello de Carvalho aos 63 anos, desceu do palco - depois de cancelado o show por falta de público - e com a humildade de quem havia passado a maior parte da vida servindo (trabalhou como empregada doméstica), juntou-se a Kermes e ao amigo, e entre uma prosa e outra, serviu-os com um bocadinho de música. Foi o que bastou para que a figura da artista não saísse mais do imaginário do jornalista, que sempre quis realizar um trabalho para contar a vida de Clementina às gerações vindouras e também para trabalhar a auto-estima da comunidade negra, através da história de vida marcante da mulher que, segundo diziam os críticos da época, trazia à cultura brasileira a referência africana, com a voz que aprendeu a cantar com a mãe, filha de escravos. Produção Com projeto iniciado em 2003 e ainda sem nenhum apoio financeiro de empresas ou instituições interessadas, Kermes assumiu a direção, com roteiro da pesquisadora Míriam Cris Carlos (sua esposa) e produção da jornalista Luciana Lopez, para a confecção do documentário, provisoriamente intitulado: Clementina, cadê você?, que deve ser finalizado no primeiro semestre deste ano. Com roteiro e argumento acabados no final de 2008, o documentário, que terá 50 minutos e está em fase de produção, será composto por depoimentos de amigos e pessoas que conviveram com a cantora e pesquisadores de música brasileira e cultura afro-brasileira. Leci Brandão e Martinho da Vila já concederam a entrevista e ainda faltam algumas personalidades a serem entrevistadas. Na primeira semana de fevereiro, a equipe de filmagem irá até o município de Valença (RJ), onde Clementina nasceu, para se aprofundar um pouco mais nas histórias da cantora. Como explicou Kermes, a relação da cidade com ele é bastante forte. Entre as dificuldades enfrentadas para a produção do vídeo, estão a pouca informação biográfica sobre a artista, e a falta de material audiovisual. Apenas dois livros contam a trajetória de Clementina, e um deles já está com a edição esgotada. Encontramos um pesquisador - Heron Coelho - que compilou textos sobre ela, e é o que está nos norteando, falou o jornalista. Afro-estima Mais um artista negro com história de ascensão através da arte? Sim. Kermes, que é diretor do documentário João do Vale - Muita Gente Desconhece, que conta a vida e obra do cantor e compositor maranhense, João do Vale, diz que a intenção é chamar a atenção da própria comunidade negra, com exemplos de outros negros. Além, claro, do registro para a memória. Mas para que o documentário - que já conseguiu espaço de veiculação no Canal Brasil através de contatos com o ator sorocabano e amigo pessoal de Kermes, Paulo Betti - seja o mais fiel possível à trajetória de Clementina, a equipe de produção do documentário pede a quem teve convívio com Clementina ou possui materiais como fotografias, filmes ou qualquer outro material referente à cantora e queira contribuir entre em contato pelo email: docclementinadejesus//clementinacadevoce.blogspot.com/ Quem é Quelé? Nascida em Marquês de Valença (RJ) em 7 de fevereiro de 1901, Clementina de Jesus da Silva também era conhecida como Tina ou Quelé. Mudou para capital ainda jovem e, morando no bairro Osvaldo Cruz, viu nascer e crescer a escola de samba Portela, e ainda muito jovem já freqüentava as rodas de samba. Em 1940, após o casamento mudou para a Mangueira. Clementina trabalhou como empregada doméstica por mais de 20 anos, até ser descoberta pelo compositor Hermínio Bello de Carvalho, em 1963. Começou participando do show Rosa de Ouro, e culminou sendo considerada rainha do partido alto, devido seu timbre de voz inconfundível. Tanto que foi homenageada por Elton Medeiros com Clementina, Cadê Você? e foi cantada por Clara Nunes com o P.C.J, Partido Clementina de Jesus, em 1977, de autoria do compositor da Portela Candeia. Em 1968, registrou o histórico LP Gente da Antiga ao lado de Pixinguinha e João da Baiana. Gravou cinco discos solo e fez diversas participações, em discos de outros artistas. Faleceu em 19 de julho de 1987.
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