3 de mai. de 2011

Livro aborda semelhanças entre Blues e Hip Hop

 Ipanema on line - 03/05/2011
AGENCIAJOR/UNISO
Imaginar que o Hip Hop de hoje é o Blues de ontem. Como define o professor doutor Paulo Celso da Silva, do Programa de Pós-Graduação em Comunicação e Cultura da Universidade de Sorocaba (Uniso), é “quase uma heresia”. Silva foi orientador de Thífani Postali, durante a realização da dissertação de Mestrado, que originou no livro “Blues e Hip Hop: Uma Perspectiva Folkcomunicacional”, lançado nesta quarta-feira, 4, durante o  Folkcom 2011, em Juiz de Fora, Minas Gerais.

A obra propõe um mergulho na história e prática dos dois ritmos musicais a fim de compará-los, mediante ideias que teorias da comunicação e da cultura trazem sobre o tema. De discussões teóricas a curiosidades que deixam qualquer um com vontade de ler o livro todo, Thífani traz em seus capítulos questões que saltam aos olhos, como o fato de as letras com temas amorosos, nas canções de blues – estilo musical criado por negros que em seu tempo eram postos à margem da sociedade –, terem sido, na realidade, escritas em menção aos chefes daqueles músicos, quando em ambientes de trabalho nos quais eram explorados, o que pode ser observado no seguinte trecho: “Minha garota é tão cruel, ela não me trata bem, ela fica com todo o meu dinheiro”.

“A relação Blues – Hip Hop ficava confirmada a cada dia de pesquisa: ambos eram discursos de grupo, ambos eram discursos de resistência e, ainda assim, guardavam suas identidades e características”, descreve o professor Paulo Celso da Silva, que chama atenção para um quadro demonstrativo elaborado por Thífani, que está no último capítulo do livro. “Em minha opinião, é um mapa comparativo muito claro do Blues e do Hip Hop”, define. Neste quadro é possível observar, por exemplo, que os dois gêneros musicais têm os negros como seus criadores, bem como ambos valorizam a oralidade na música e a utilizam como o meio de comunicação específico de um grupo. Outro ponto interessante é que tanto Blues quanto Hip Hop trazem em suas letras críticas sociais e falam sobre o cotidiano dos territórios marginalizados onde vivem, entre outras semelhanças.

Inovador, o assunto explorado por Thífani causa entusiasmo até mesmo entre estudiosos familiarizados com a área de pesquisa. A professora doutora Míriam Cristina Carlos Silva, também do Programa de Pós-Graduação em Comunicação e Cultura da Uniso e que integrou a banca examinadora da dissertação de Thífani, conta que desde o início, quando ouvia falar sobre a ideia do estudo nos corredores da universidade, a ousadia do tema já causava as melhores das impressões. “É um grande achado pensar o hip hop em diálogo com o blues, discutir processos de exclusão a partir da comunicação e da cultura, revisitar a história e interpretar, a partir da cultura e do passado, o presente. A pesquisa faz transitar elementos de culturas distintas, mostrando aquilo que lhes é comum e duradouro”, comenta Míriam.



Raízes musicais

Outro aspecto que agrada a professora Míriam Carlos, na pesquisa de Thífani, é o envolvimento da autora com seu tema. Para ela, Thífani, acertadamente, seguiu pelo caminho da chamada pesquisa participativa, na qual o pesquisador se mistura ao objeto de estudo para vivenciá-lo. “Isso foi meio que algo natural. Minha vida acadêmica esteve sempre em negociação com a música”, confessa Thífani. Ela revela que, como fazia parte de uma banda e não queria deixar de tocar, optou por não ingressar em universidades públicas, já que na época eram distantes. Depois de se graduar em Comunicação Social e de ter concluído a especialização em Marketing, Thífani partiu para o Mestrado em Comunicação e Cultura. Sem ter por onde escapar, era hora de abrir mão de suas andanças por bares e casas culturais da cidade. “Senti ter de abandonar as atividades musicais. Elas consumiam disposição, tempo. Foi quando resolvi conciliar minhas duas paixões em estudos: música e comunicação”.

E no primeiro contato com o orientador da dissertação a música já estava presente. O professor Paulo Celso da Silva lembra que foram reunidos, para alguma atividade da universidade, mestres e alunos com habilidades musicais. “Thífani ainda estava na graduação. Nem imaginávamos que nos encontraríamos depois, no mestrado. Na oportunidade, ela ficou no violão e vocal, eu no baixo. A diversão era garantida nos ensaios”, conta o professor.


Folkcomunicação

Thífani acertou em todos os pontos: desde a escolha do objeto de estudo até a opção pela folkcomunicação como principal veia teórica de seu trabalho. “Ela inverteu a mão, como se diz. Analisou uma manifestação estadunidense com um referencial brasileiro, quando a maioria dos pesquisadores faz o contrário”, analisa o orientador.

A professora doutora Maria Cristina Gobbi, do Programa de Pós-Graduação em Comunicação e Cultura da Uniso, e referência nos estudos sobre folkcomunicação, assina o posfácio do livro. Ela explica que a folkcomunicação é resultado da tese defendida pelo professor pernambucano Luiz Beltrão (1918 – 1986), primeiro doutor em comunicação do Brasil, em 1967, na Universidade de Brasília. Segundo a professora, Beltrão analisava a comunicação popular como manifestação própria dentro de um determinado grupo cultural e apresentava a folkcomunicação como um potencial estratégico para o diálogo com as classes marginalizadas.

É onde se insere o estudo de Thífani. “Ela evidencia com clareza como as teorias folkcomunicacionais ajudam no entendimento dos cenários, atores participantes da ação comunicativa e das interações com a cultura e com a mídia, em uma mescla de tradição e atualidade. É uma leitura obrigatória para estudantes e pesquisadores que têm nos ritmos culturais uma faceta de investigação”, decreta Maria Cristina. 



Lançamento

O convite para o lançamento do livro durante a Folkcom 2011 partiu da pesquisadora Maria Érica de Oliveira Lima, professora Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) e da Rede Folkcomunicação - Rede de Estudos e Pesquisas em Folkcomunicação.

 “Conheci Thífani Postali no Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação – Intercom, em Caxias do Sul, em 2010, no Grupo de Pesquisa de Folkcomunicação. É essencial durante os congressos observarmos e assistirmos a produção de jovens pesquisadores a despontar na investigação, trazendo-nos discussões, pensamentos e reverberações que cooperam com o avigoramento do campo, como fazia Thífani desde aqueles tempos”, lembra Maria Érica.

A Folkcom 2011 acontece entre 4 e 7 de maio, em Juiz de Fora, Minas Gerais, em uma realização conjunta entre a Faculdade de Comunicação Social da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), o Programa de Pós-Graduação da UFJF e a Faculdade Estácio de Sá. O evento é promovido pela Rede de Estudos e Pesquisa em Folkcomunicação (Rede Folkcom) e pela Cátedra Unesco de Comunicação.

Isabella Reis (AgênciaJor/Uniso)

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