05/05/2013 - Pág. C1
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Depois de dez anos de sua morte, Oficina Cultural Grande Otelo prepara semana dedicada ao artista
Carlos Roberto Mantovani era um poliglota das artes. Falava todas as línguas: a do teatro, a das artes plásticas, a da dança e a da escrita. Escrevia, atuava e dirigia espetáculos teatrais, dançava, desenhava, pintava e escrevia poesias. Não bastasse saber usar todas essas linguagens, Manto, como era chamado pelos mais próximos, fazia cada uma delas com sensibilidade e preciosidade e, mesmo depois de 10 anos de sua morte, o artista de diversas faces permanece no lugar que alcançou em vida: é uma das personalidades mais importantes para a cultura sorocabana, sendo lembrado por aqueles que são de sua geração, e influenciando os novos pensadores da arte na cidade.
E é para lembrar seu feitos e deixá-los impressos na memória das artes de Sorocaba que um grupo de artistas vai promover uma semana de atividades culturais na Oficina Cultural Grande Otelo - que tantas vezes foi sede de suas oficinas e intervenções artísticas. Nomeado de Quarup para Mantovani, já que quarup é um ritual de homenagem aos mortos ilustres celebrado pelos povos indígenas da região do Xingu, o projeto tem atividades que começam a ser realizadas amanhã e seguem até a próxima sexta-feira, dia 10. Será uma semana de bate-papos, exibições de vídeo, performances que vão mergulhar, desvendar e rememorar a história, a obra e as ideologias de Carlos Roberto Mantovani, que deixou, entre tanto legados, o grupo Manto de Teatro, fundado após seu falecimento, ocorrido no dia 8 de maio de 2003, vítima de um câncer.
Autodidata, Manto tem uma história tão interessante quanto suas obras. Nasceu em 1950, na cidade de Laranjal Paulista, mas foi aqui em Sorocaba que ele surgiu para um grande público como um artista com diversas facetas. Mesmo trabalhando para sustentar os irmãos e a mãe viúva - Mantonvani trabalhou na Companhia Nacional de Estamparia (Cianê) -, ele não deixou de lado sua sede pelo saber cultural e mergulhou na leitura. Aprendeu a manifestar em forma de arte suas ideias e ideais a partir do contato com a leitura e com alguns mestres aqui da cidade, entre eles Janice Vieira, com quem, nos anos 1970, aprendeu os primeiros passos da dança.
Seu lado poeta pode ser conhecido em 1984, ano em que foi publicado o livro Redundâncias, com algumas de suas inspirações concretizadas em formas de textos. E o primeiro palco para seus trabalho como diretor artístico foi o Espaço Cultural dos Metalúrgicos, missão que começou em 1992 e seguiu ali até o ano 2000. Nesse mesmo período, Mantonvani mostrou seus talentos como programador cultural da Oficina Cultural Grande Otelo, que sediou muitas de suas peças teatrais e oficinas de artes e foi um dos promotores de eventos como o Curta Teatro e o Curta Dança.
Por uma vida mais digna para todos
Após sua morte, a consideração por seu trabalho e sua contribuição para a cultura da cidade ficaram evidentes em homenagens póstumas, como as que deram seu nome ao Espaço Cultural do Sindicato dos Metalúrgicos e o Teatro de Arena, anexo ao Teatro Municipal de Sorocaba. Também em 2008, foi publicado o livro Escritos Ordinários, uma compilação de suas poesias e uma indicação da versatilidade e grandiosidade de Mantovani ao contar sua história, mostrar ainda seus feitos no teatro e nas artes plásticas. A breve biografia presente nessa publicação ressalta a humanidade presente em sua obra e na forma como tentava usar a arte para manifestar "as reivindicações socialistas de uma vida mais digna para todos".
Pouco antes de falecer, Mantovani escreveu poesias que demonstram o quanto a doença provocou nele um processo ainda mais reflexivo e intenso. "Ficou em você/ não os tumores/ esses eu os carrego/ não os odores/ esses eu os suporto/ Velhos pesadelos/ as marcas/ o desprazer/ os guizos de serpentes milenares/ gritos abafados/ passos falsos/ desencantos/ Ficaram de você/ Outros tumores/ Outros odores/ Novos pesadelos." Antes disso, porém, o artista já revelava que a sensibilidade habitava nele com furor. "O dragão que me queima é o mesmo que me salva", escreveu Carlos Roberto Mantovani no livro Redundâncias.
Serviço
A Oficina Cultural Grande Otelo fica na Praça Frei Baraúna, s/n. Informações: (15)3224-3377 / (15)3232-9329 / www.oficinasculturais.org.br.
Confira a programação projeto 'Quarup para Mantovani'
Notícia publicada na edição de 05/05/2013 do Jornal Cruzeiro do Sul, na página 001 do caderno C
Miriam Cris Carlos - Por: Erick Pinheiro/Arquivo JCS
Bate-papo e exibição do vídeo documentário Mantovani
Amanhã, às 19h
Coordenadores: Míriam Cris Carlos e Werinton Kermes
Público: interessados em geral
40 vagas
O documentário Mantovani produzido na década de 90 e lançado no ano 2000 é parte do projeto Vídeo Memória, cujo objetivo foi criar e divulgar um acervo oral sobre pessoas relevantes para a cultura sorocabana. Nele, o artista multimídia Mantovani relata sua infância pobre, sua paixão pelo cinema e seu envolvimento com a arte. Após a exibição, haverá bate-papo com os realizadores sobre a escolha do entrevistado, Mantovani, e sobre sua importância como artista.
Doutora em Comunicação e Semiótica e pós-doutora em Comunicação Social, Míriam Cris Carlos é especialista em Teoria da Literatura e professora pesquisadora do Mestrado em Comunicação e Cultura da Universidade de Sorocaba.
Fotógrafo, jornalista e documentarista, Werinton Kermes foi secretário da Cultura da cidade de Votorantim. Autor do livro Política e Ação Cultural: Por uma Gestão das Culturas; ganhador do prêmio de Melhor Vídeodocumentário no Festival de Gramado, com João do Vale: Muita Gente Desconhece.
"São inúmeras as contribuições de Mantovani, por ser ele um artista multimídia, antes mesmo que esta palavra existisse. Sua inquietação produziu dramaturgia, ótima literatura e desenhos maravilhosos. Promoveu a formação de público e, especialmente, de profissionais para o teatro. Muitos atores, diretores, produtores, cenógrafos, iluminadores, dos veteranos aos mais jovens, aprenderam com ele, atuaram com ele ou assistiram aos espetáculos que ele dirigiu, e carregam na pele e na alma a marca de seu lirismo dolorido e profundo"
Miriam Cris Carlos
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