Notícia publicada na edição de 05/02/2010 do Jornal Cruzeiro do Sul, na página 5 do caderno B Daniela Jacinto e Maíra Fernandes
O público tem até amanhã para conferir a exposição ¿O outro olhar: fotografia com o corpo e seus sentidos¿, no Sesc Pinheiros, em São Paulo. Sob coordenação da doutora em Comunicação e Semiótica Míriam Cris Carlos e do fotógrafo e jornalista Werinton Kermes, a mostra é resultado da oficina de fotografia para deficientes visuais realizada pelos sorocabanos neste mês de janeiro, também no Sesc Pinheiros. São ao todo 40 imagens do making off da oficina e mais 40 tiradas pelos participantes que, orientados por outros sentidos, como tato, audição e olfato, registraram o movimento de camelôs, a passagem de um helicóptero, artistas de circo e algumas ruas de São Paulo. Conforme Míriam, a oficina, que contou com 12 participantes, surpreendeu desde o início. ¿O curso era voltado inicialmente para deficientes visuais, mas acabou interessando a outras pessoas também, das mais variadas profissões. Tinha pedagogo, psicopedagogo, fotógrafo e estudante de arte, então vendamos seus olhos para que todos trabalhassem guiados por outros sentidos como o olfato, tato e audição¿, esclarece. O resultado é que guiados pelos sentidos, os participantes produziram fotografias com ângulos bastante diferenciados. ¿Quando é assim, a pessoa tenta capturar a imagem pela direção do som, resultando em imagens não-icônicas, o que é denominado na semiótica de metonímia, ou seja, um recorte do objeto, mas que resulta numa fotografia interessante. É um trabalho que conta com a poética do acaso, funciona pelo inusitado do recorte, pela ausência da visão e, nesse caso, até mesmo uma imagem desfocada é interessante.¿ Míriam afirma que muitos deficientes visuais deixam de fotografar por falta da capacidade de conferir o resultado do que fizeram. ¿Mas quando começam a produzir e unem essa prática à cumplicidade de alguém que vai relatar o que é aquela imagem, eles percebem que têm condições de reviver aquele momento através da narrativa do outro. Já fizemos uma tentativa de perfurar alguns contornos, deixar uma montanha em relevo, para que eles pudessem perceber o que tinham retratado, mas esse seria outro trabalho além da fotografia¿, diz. Ainda de acordo com Míriam, mais do que uma oficina de fotografia, o curso acaba proporcionando a inclusão: ¿A gente não pode pensar que uma pessoa que não enxerga está limitada. Ela pode ir ao cinema por exemplo e se o áudio for em português ela vai conseguir acompanhar a narrativa. Hoje no Brasil são cerca de 11 a 12 milhões de pessoas com deficiência visual, e a gente não vê muitos essas pessoas por aí. É um público bastante confinado, é assustador saber que tem tanta gente excluída, então com esse tipo de trabalho, além do lado estético, de falar de arte, o curso acaba sendo uma grande desculpa para a inclusão. No Sesc essa experiência foi ainda mais interessante porque aqueles que enxergam puderam viver um pouco da sensação e entender mais o problema¿. O convite para Míriam e Werinton ministrarem a oficina foi feito pelos programadores do Sesc, pela iniciativa pioneira no desenvolvimento de pesquisas sobre produção de imagens por deficientes visuais, que realizaram a primeira oficina em 2002, em Sorocaba. Após essa primeira experiência, o trabalho foi realizado em outros lugares, entre eles, em Belém, por dois anos seguidos e, a partir de então, surgiram projetos similares em todo o país. Inclusive o Senac, na sua graduação em fotografia, em São Paulo, passou a ministrar oficinas para deficientes visuais. ¿Em 2002, causamos enorme estranheza. Hoje até máquina fotográfica para deficientes visuais já foi desenvolvida por um designer chinês¿, observa Míriam. Durante o curso são oferecidas noções de distância para a captação de imagens, de recorte e composição, além de discussões sobre a arte, o poético, o erro e o acaso, para capacitar os participantes a operar uma máquina simples e registrar imagens a partir do tato, da audição, do olfato. O próximo projeto dos sorocabanos é realizar uma oficina para a produção de imagens em movimento, que serão transformadas em um documentário produzido pelos participantes, deficientes visuais. SERVIÇO: Exposição fotográfica no Sesc Pinheiros (rua Paes Leme, 195, Pinheiros, em São Paulo). As visitas podem ser feitas hoje, das 10h às 21h, e amanhã, das 10h às 18h. Outras informações: (11) 3095-9400.
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